15 maio 2012

Mais Saúde + Você: A Humanização Na Saúde Mental

Por Kleber Godoy

Nesta seção, como já destacamos no post explicativo sobre seus objetivos, o assunto é sério: saúde. Um tema abrangente, que envolve diversas ciências e, principalmente, a vida de cada um de nós. Assim, buscando criar um espaço para pensar o que podemos fazer para contribuir neste quesito, trazemos hoje uma elucidação do que se pode fazer como cidadão para excluir menos e incluir mais. No mês de maio comemoramos a semana da Luta Antimanicomial, que pouca gente conhece e fica ainda bastante restrito aos profissionais de saúde e trabalhadores dos centros de saúde ligados à esta causa. Esta luta é algo que me cativa muito pois já fui ator dentro de um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e vi como o trabalho dos mais diversos campos da saúde pode contribuir para a felicidade das pessoas que sofrem com a exclusão social por conta de uma diferença de comportamento da maioria das pessoas. Para falar um pouco sobre este movimento de saúde tão importante e que abrange vários países no mundo, compilo abaixo vários trechos de definições e explicações que levam a um conhecimento maior de você, leitor do blog, deste movimento. Após esta elucidação propomos uma reflexão, ao final desta postagem.



Movimento Antimanicomial e Centro De Atenção Psicossocial

O Movimento Antimanicomial , também conhecido como Luta Antimanicomial, se refere a um processo mais ou menos organizado de transformação dos Serviços Psiquiátricos, derivado de uma série de eventos políticos nacionais e internacionais. O termo costuma ser usado de modo generalizante e pouco preciso. O Movimento Antimanicomial tem o dia 18 de maio como data de comemoração no calendário nacional brasileiro. Esta data remete ao Encontro dos Trabalhadores da Saúde Mental, ocorrido em 1987, na cidade de Bauru, no estado de São Paulo.

Na sua origem, esse movimento está ligado à Reforma Sanitária Brasileira da qual resultou a criação do Sistema Único de Saúde - (SUS); está ligado também à experiência de desinstitucionalização da Psiquiatria desenvolvidas em Gorizia e em Trieste, na Itália, por Franco Basaglia nos anos 60. Como processo decorrente deste movimento, temos a Reforma Psiquiátrica, definida pela Lei 10216 de 2001 (Lei Paulo Delgado) como diretriz de reformulação do modelo de Atenção à Saúde Mental, transferido o foco do tratamento que se concentrava na instituição hospitalar, para uma Rede de Atenção Psicossocial, estruturada em unidades de serviços comunitários e abertos.

Política pública de saúde mental é um processo político e social complexo, composto de participantes, instituições e forças de diferentes origens que acontece em diversos territórios. É um conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, e é no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais que o processo da política avança, passando por tensões, conflitos e desafios.

Nos séculos passados, quando ainda não havia controle de saúde mental, a loucura era uma questão privada onde, as famílias eram responsáveis por seus membros portadores de transtorno mental. Os loucos eram livres para circulação nos campos, mas, nem tudo eram flores. Eles também eram alvo de chacotas, zombarias e escárnio público.

Com o passar dos anos, começou então a discussão e luta pela implantação de serviços de saúde mental no Brasil. Foi ai então que surgiram as primeiras instituições, no ano de 1841 na cidade do Rio de Janeiro, que era um abrigo provisório, logo após surgirem outras instituições como hospícios e casas de saúde. Somente agora no final do século XX é que a militância por serviços humanizados consegui às primeiras implantações de Centros de Atenção Psicossocial os CAPS.

Foi em 2001 que a Lei Paulo Delgado foi sancionada no país. A Lei redireciona a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais, mas não institui mecanismos claros para a progressiva extinção dos manicômios.

Os Centros de Atenção Psicossocial são instituições brasileiras que visam à substituição dos hospitais psiquiátricos - antigos hospícios ou manicômios - e de seus métodos para cuidar de afecções psiquiátricas.

Os CAPS, instituídos juntamente com os Núcleos de Assistência Psicossocial (NAPS), através da Portaria/SNAS Nº 224 - 29 de Janeiro de 1992, são serviços públicos de saúde mental, destinados a atender indivíduos com transtornos mentais relativamente graves. Esse serviço é uma substituição as internações em hospitais psiquiátricos, e tem como maior objetivo tratar a saúde mental de forma adequada, oferecendo atendimento á população, realizando o acompanhamento clínico, e promovendo a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho e ao lazer, a fim de fortalecer os laços familiares e comunitários.

Esse serviço oferece três modalidades de tratamento (intensivo, semi-intensivo, e não intensivo), que variam de acordo com a necessidade do indivíduo.

O atendimento intensivo trata-se de atendimento diário oferecido quando a pessoa se encontra com grave sofrimento psíquico, em situação de crise ou dificuldades intensas no convívio social e familiar, precisando de atenção contínua. Esse atendimento pode ser domiciliar, se necessário. O semi-intensivo, no qual, o usuário pode ser atendido até doze dias no mês, sendo que essa modalidade é oferecida quando o sofrimento e a desestruturação psíquica da pessoa diminuíram, melhorando as possibilidades de relacionamento. E o não intensivo, que é oferecido quando a pessoa não precisa de suporte da equipe para viver em seu território e realizar suas atividades na família e/ou no trabalho, podendo ser atendido até três dias no mês.

Modelo proposto na Itália, em Trieste, e que está sendo construído e adaptado no Brasil desde 1986. Consiste em um local que oferece cuidados intensivos, semi-intensivos ou não intensivos a pacientes em sofrimento psíquico diagnosticados como neuróticos graves ou psicóticos que podem já ter ou não histórico de internação e/ou tratamento. É função do CAPS:

- Prestar atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando as internações em hospitais psiquiátricos;

- Acolher e atender as pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, procurando preservar e fortalecer os laços sociais do usuário em seu território;

- Promover a inserção social das pessoas com transtornos mentais por meio de ações intersetoriais;

- Regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação;

- Dar suporte a atenção à saúde mental na rede básica;

- Organizar a rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos municípios;

- Articular estrategicamente a rede e a política de saúde mental num determinado território;

- Promover a reinserção social do indivíduo através do acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários.

Estes serviços devem ser substitutivos e não complementares ao hospital psiquiátrico. De fato, o CAPS é o núcleo de uma nova clínica, produtora de autonomia, que convida o usuário à responsabilização e ao protagonismo em toda a trajetória do seu tratamento.




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"Acima abordamos somente uma das modalidades de atendimento neste sentido, da Reforma Psiquiátrica, mas também existem outros, como os CAPSad (voltado ao atendimento de pessoas com problemas de álcool e drogas) e CAPSi (para atendimento de crianças com transtornos mentais), entre outros. Dizer não à exclusão começa no dia a dia e em todos os espaços... aqui falamos somente de um deles. O importante de se pensar aqui é que o Brasil é um dos países do mundo mais avançados na luta contra a exclusão social de pessoas com transtornos mentais e um dos mais bem equipados no que se trata de ampliação deste atendimento. Claro que há muito o que se fazer (sempre haverá), mas estamos bem neste sentido. O trato com a loucura se alinha com a luta contra a exclusão e com a insersão social de pessoas, como eu e você, que só querem ser aceitas no meio comum em que vivem, tão simples e tão importante assim. Quando atuei nesta área o mais fascinante era a facilidade de se ir além das técnicas para poder simplesmente vivermos em comunidade (comum unidade): eu psicólogo, o enfermeiro, a nutricionista, a educadora física, o farmacêutico, o médico, a faxineira, a diretora e o usuário. Todos em pé de igualdade vivendo, aprendendo, sentindo a beleza de ser humano, cada um com seus momentos de loucura e de sanidade. O próprio SUS estabelece que a conversa entre as diversas profissões deve levar a este objetivo: a humanização. Neste sentido vale ressaltar a questão do Ato Médico, o qual falarei aqui mais adiante, movimento de uma parcela dos médicos, que pretende interferir na área da saúde eliminando a igualdade e instaurando uma hierarquia na qual o médico conduz e os demais são os conduzidos, indo na contramão de tudo aquilo que conquistamos na área da saúde mental no país através das décadas. No mais, o que isso tudo tem a ver com a sua vida, que não é profissional de saúde? Bem, tem muito a ver. A prática da não exclusão pode e deve ser praticada em nosso dia-a-dia em todos os espaços, desde a própria casa, passando pela vizinhança, pela escola, pelo local de trabalho e chegando até o CAPS. A ação de cada cidadão tentando ser menos preconceituoso, mais aberto a novas experiências e ao contato sincero com outro ser humano com respeito e sensibilidade é que nos leva a bons encontros e à humanização: chega de tratar o outro como objeto. Por fim, se você se interessou pela causa, os CAPS são abertos à comunidade: procure conhecer um, converse com as pessoas atendidas, doe um pouco de seu tempo para ser voluntário desta causa e receba sorrisos e belas e criativas histórias das pessoas que lá encontrar. Lembrando que a maioria dos atendidos no CAPS não tem famílias que os acolham e chegam até lá com um histórico de muitas perdas, sendo assim sua presença algo bastante importante."

Kleber Godoy*

A loucura, objeto de meus estudos, era até agora uma ilha perdida no oceano da razão; começo a suspeitar que é um continente. (Machado de Assis, em O Alienista)


Para entender a dinâmica do 'O Teatro Da Vida' visite a página sobre o blog.





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* Kleber Godoy é graduado em Psicologia pela Universidade São Francisco e pós-graduando em Acupuntura Tradicional Chinesa pela Faculdade Einstein. Atualmente trabalha com psicoterapia psicanalítica, psicoterapia de grupo e orientação profissional nas cidades de Piracaia e Campinas, em São Paulo. Entre em contato pelo correio eletrônico: kleberxgodoy@gmail.com

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1 comentários:

  1. Camilo Francisco Ghorayeb16 maio, 2012 00:10

    Parabéns Kleber! Muito bacana esse blog! E muito importante o texto tb!
    Abraço!

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